domingo, 12 de junho de 2016

ITAÚNA: VOCABULÁRIO QUIMBUNDO PARTE II


VOCABULÁRIO QUIMBUNDO
Parte II

E é coisa curiosa a examinar o povoado do Catumba, que se me afigura às ruínas de considerável quilombo. Ainda hoje só é habitado por pretos que só falam entre si o quimbundo [...].

Ainda me lembro bem de vários tipos populares negros, hoje desaparecidos, que serviam de troça para os moleques de Itaúna. Eram pretos de ascendência africana, si não direta, pelo menos muito próxima.

E como era costume aditar ao nome do negro o da nação a que pertencia, chamavam a esses pretos Vicente Bunda[1], Chico Bié, Cristina Bunduda, sendo que está me parece Kakuana, pela pequena estatura e a monstruosa esteatopigia[2] que apresentava.

Língua de formação bem rudimentar ainda, o congoês, pelos seus dialetos, não possui os atributos e as flexões que apresentam as línguas mais evoluídas como o português. 

Por isso, o quimbundo que surpreendi em Minas recorre sempre ao português nos casos em que o dialeto não possui recurso para a expressão. Estão neste caso os artigos demonstrativos, as conjunções, etc. 

Aliás, utilizam esses recursos em casos absolutamente indispensáveis por motivo de clareza. O dialeto não os possui. Quando querem dizer:  - “ O João fala muito bem a língua de preto”, se expressam assim: - “João oméra navuro quiapossóca undaca de quimbundo”.

A formação do feminino também é de simplicidade infantil. Resume-se em ajuntar a palavra -  mulher (ocaia ou mandumba) ao subistantivo a ser modificado: - rei (vicóra), Rainha (ocaia do vicóra) – mulher do rei. Porco (camguro), porca (mandumba do canguro) [3].

O número de verbos é reduzidíssimo e nunca flexionam para as diversas expressões de tempo e modo. A compreensão exata da frase se consegue pelo assunto de que trata a oração. Cachia, por exemplo, é o infinito do verbo chegar.

E a frase: O cuêto vindêro cachia no curimã, que dizer: -  o branco está chegando no serviço ...

[1] É interessante o fenômeno que se deu com esta palavra no Brasil. Bunda ou M’bunda pe adjetivo gentílico de um povo bántu. Por extensão, empregavam-na com a significação de ruim, feio, reles, inferior. E por isso é empregada vulgarmente para designar a anatomia posterior aos ossos da bacia (nádegas) ...

[2] Esteatopigia é um termo médico que define o acúmulo de gordura nas nádegas.

[3] Quer me parecer que mandumba eles empregam quando se tratam de irracionais e vicóra quando de gente.

Texto extraído do livro: FILHO, João Dornas. A Influência Social do Negro Brasileiro. Ed. Guaíra, São Paulo, 1942, p.72-73. 
Pesquisa e elaboração: Charles Aquino


Local: Itaúna - MG, Brasil

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